domingo, 31 de agosto de 2014

Os cadáveres de António Novais

Cada um tem as suas formas de aproveitar o seu tempo de lazer, e o autor destas linhas tem naturalmente as suas. Gosta de percorrer arquivos digitais (os arquivos em espécie, geralmente distantes, ficam fora do seu alcance temporal e financeiro) em busca de fotografias que conhece e, sobretudo, de imagens que desconhece.
Na dispersão que lhe é característica, tudo lhe interessa, e neste tudo algumas coisas em particular o cativam. As esquecidas turbulência e violência da primeira metade do século vinte português, são uma delas.

Navegando pelo motor de pesquisa do Arquivo Fotográfico Municipal de Lisboa, um pouco ao calhas, deparou-se-lhe um estranha e macabra imagem desta temática. Da ficha disponibilizada, sabe-se ser de 1908, da autoria de António Novais (ou Novaes, grafia mais provável na data em questão).

António Novais,
Cadáveres amontoados na morgue,
Lisboa, Portugal, 1908
imagem obtida aqui


Sem mais dados que esclareçam os factos que estão na sua origem, arrisca-se a seguinte contextualização. Os cadáveres amontoados da imagem, pelo seu número, poderão ser as vítimas da contestação aos resultados das eleições de Abril desse ano, realizadas com vista à obtenção dum governo de "Acalmação" que serenasse o país após o assassinato do rei D. Carlos e do príncipe-herdeiro, D. Luís Filipe, em Fevereiro desse ano.
Os mesmos factos que estão por detrás da espantosa fotografia de Joshua benoliel, com sinais de sangue numa parede.

Joshua Benoliel,
Sinais feitos com sangue pela população numa parede,
Lisboa, Portugal, 1908
imagem obtida aqui

Duas imagens dum país de costumes não particularmente brandos, enfim.

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